CARTA DO MONS. LEFEBVRE AO CARDEAL RATZINGER

+ Albano, 26 de maio de 1988

Eminência,
Parece-me necessário precisar o que vos escrevi em 6 de maio último.
Depois de bem refletir, afigura-se-nos claramente que o objetivo dos colóquios e da reconciliação é reintegrar-nos na Igreja Conciliar, única Igreja à qual fazíeis alusão nesses colóquios.
Pensávamos que nos daríeis os meios de continuar e desenvolver as obras da Tradição, especialmente dando-nos alguns coadjutores, pelo menos três, e dando também, na Comissão Romana, uma maioria à Tradição.
Ora, nesses dois pontos, que nos parecem necessários para manter as nossas obras livres de qualquer influência progressista e conciliar, não obtivemos satisfação.
É por isso que, com grande pena, nos vemos obrigados a pedir-vos que, antes do dia 1 de junho, nos indiqueis claramente quais são as intenções da Santa Sé sobre esses dois pontos: consagração dos três Bispos postulados para 30 de junho, e maioria dos membros da Tradição na Comissão Romana.
Se não tiver resposta a estes pedidos, procederei à publicação dos nomes dos candidatos ao Episcopado, que consagrarei a 30 de junho com a colaboração de S. Exa. Mons. de Castro Mayer.
A minha saúde, as necessidades apostólicas para o crescimento de nossas obras, já não permitem atrasos suplementares.

+ Marcel Lefebvre

RESPOSTA DO CARDEAL RATZINGUER A MGR. LEFEBVRE

  Citta del Vaticano, 30 de maio de 1988  

Excelência,

Depois de ter sido recebido em audiência pelo Santo Padre, sexta-feira 27 de maio, como vos tinha indicado no nosso colóquio de 24, estou em condições de responder à carta que me haveis entregue nesse mesmo dia a respeito dos problemas da maioria dos membros da Fraternidade na Comissão Romana e da sagração dos bispos.
A respeito do primeiro ponto, o Santo Padre considera que convém manter os princípios definidos no ponto II/2 do protocolo que haveis aceitado. Essa Comissão é um órgão da Santa Sé a serviço da Fraternidade e das diversas instâncias com as quais será preciso tratar para estabelecer e consolidar a obra da reconciliação. Para mais, não é ela, mas o Santo Padre, quem, em última instância, tomará as decisões: portanto, a questão da uma minoria não se levanta; os interesses da Fraternidade são garantidos pela sua representação no seio da Comissão, e os receios que exprimistes em relação aos outros membros não têm razão de existir, uma vez que a escolha desses membros será efetuada pelo próprio Santo Padre.
No que diz respeito as segundo ponto, o Santo Padre confirma o que já vos indiquei da sua parte, a saber que ele está disposto a nomear um bispo membro da Fraternidade (em conformidade com o ponto II/5.2 do protocolo), e a fazer acelerar o processo habitual de nomeação, de forma que a consagração possa ter lugar no encerramento do Ano Mariano, em 15 de agosto próximo.

[Como se sabe, todos os candidatos apresentados por Mons. Lefebvre haviam sido recusados (N. da R.).]

Isso requer, de um ponto de vista prático, que apresenteis sem tardar a Sua Santidade um número mais elevado de dossiês de candidatura, para lhe permitir escolher livremente um candidato que corresponda ao perfil desejado e, ao mesmo tempo, aos critérios gerais de aptidão que a Igreja determina para a nomeação dos bispos.
Sabeis enfim que o Santo Padre espera de vós uma carta contendo, no essencial, os pontos de que tratamos, e particularmente os tratados durante o nosso colóquio de 24 de maio. Mas, como ainda recentemente anunciastes a vossa intenção de ordenar três bispos em 30 de junho próximo, com ou sem a anuência de Roma, é necessário que, nessa carta (cf. 4º parágrafo do projeto), digais claramente que a isso renunciais, e que vos submeteis em plena obediência à decisão do Santo Padre.
Com essa última diligência, realizada com a menos demora possível, o processo de reconciliação chegará ao seu termo, e a notícia poderá ser dada publicamente.
Excelência, no momento de concluir, apenas posso dizer-vos, como na última terça-feira, e ainda com maior gravidade se isso é possível: quando se considera o conteúdo positivo do acordo ao qual a benevolência do Papa João Paulo II permitiu que se chegasse, não há comparação entre as últimas dificuldades que haveis exprimido e o prejuízo que constituiria agora um fracasso, uma ruptura da vossa parte com a Sé Apostólica, e somente por esses motivos. Deveis confiar no Santo Padre, cuja bondade e compreensão recentemente manifestadas em relação a vós e em relação à Fraternidade constituem também a melhor garantia para o futuro. Deveis enfim – e devemos todos – confiar no Senhor, que permitiu que a via da reconciliação fosse aberta, como o está  hoje, e que a meta pareça agora tão próxima.
Dignai-vos aceitar, Excelência, etc.

Jospeh Card. Ratzinger