Tomamos emprestado para nosso catecismo sobre a Oração, o texto do Pe. Emmanuel-André, tirado do seu Catecismo da Família. Poucas vezes encontraremos explicações, nos catecismos mais conhecidos, que saibam unir a simplicidade com a profundidade, como aqui. Chega a ser surpreendente certos temas abordados pelo Pe. Emmanuel, como o desejo e o modo como procuramos satisfaze-los. Esperamos que esta bela doutrina sirva para aumentar nosso gosto em rezar e nosso amor por Nosso Senhor.

 

A  ORAÇÃO

Introdução

1. A Nossa indigência

Qual é o estado do homem na terra?

Somos indigentes, Pauperes facti sumus nimis (Ps.LXXVIII): temos necessidade de tudo, tanto para nossa alma quanto para nosso corpo; nossa indigência é extrema.

Onde se vê a prova dessa pobreza?

Vemos no que todos sofrem e no que se queixam. A maior parte dos homens não conhece sua própria indigência, nem os remédios que deveriam procurar.

E quais são eles?

Infelizes que somos, gemia santo Agostinho, amamos nossa própria indigência, e além de amá-la, dela nos vangloriamos.

Será possível?

Sim, pelo menos por instantes, ou por algum tempo; pois nossa alma tem fome e sede de felicidade, e mesmo que queira fechar os olhos para essa necessidade, ela subsiste.

2. Nossos desejos

Nós desejamos?

Sim, nossa alma está cheia de desejos. Criada por Deus, só encontrará deleite e repouso naquele que é seu princípio e seu fim.

Quais são nossos desejos mais intensos?

Alguns são da alma, outros do corpo.

Quais são os deleites da alma?

A alma quer ver, saber, amar, gozar e ser feliz.

E os do corpo?

O corpo quer seu pão de cada dia e a cura de seus males.

Esses desejos são bons?

Sim, se são ordenados segundo a vontade de Deus.

E podem tornar-se maus?

Facilmente tornam-se maus por causa das inclinações viciosas que temos devido ao pecado original.

3. A satisfação de nossos desejos

Somos levados a procurar a satisfação de nossos desejos?

Sim, invencivelmente: não encontrando em nós o que nos falta, vamos procurar fora.

E onde vamos procurar?

Por toda parte: no alto, ao nosso redor ou abaixo de nós.

O que acontece quando procuramos abaixo de nós?

Longe de encontrarmos nosso bem, agravamos nosso mal e aumentamos nossa indigência.

E quando procuramos ao nosso redor?

Encontramos criaturas tão pobres quanto nós, incapazes de nos dar o que não têm, e que têm necessidade como nós.

O que nos resta fazer?

O único recurso é nos elevarmos acima de nós mesmos e pedir a Deus o que precisamos.

4. A oração

Como se chama o fato de uma alma se voltar assim para Deus?

Chama-se: oração; quer dizer uma elevação da alma indigente para a fonte inesgotável de todos os bens.

A oração é natural no homem?

Sim, como é natural à criança pedir a seu pai o que precisa.

E porque então a oração é tão rara?

Devido à ignorância, fruto do pecado original, não sabemos mais pedir, nem o que é preciso pedir, nem a quem pedir.

O que se conclui?

Que a graça de Deus nos é necessária para rezar, quer dizer, para elevarmos nossas almas a Deus.

E a oração é um dom de Deus?

É o que nos ensina são Paulo quando diz: “O Espírito Santo ajuda a nossa fraqueza. Pois não sabemos o que pedir nem como convém. Mas o próprio Espírito pede por nós com gemidos inefáveis (Rom.VIII,26).”

5. Motivos para rezar

Qual o nosso principal motivo para rezar?

É a necessidade que temos de Deus para alcançarmos a felicidade que almejamos.

Temos outros motivos para rezar?

Devemos rezar também para adorarmos a Deus e reconhecermos seu soberano domínio sobre nós e sobre todas as criaturas; para agradecermos os benefícios e pedirmos perdão por nossos pecados.

Os motivos para rezar sendo tais, parece que os  homens deviam rezar sem cessar?

Eles precisam rezar sem cessar, e devem isso a Deus, mas seu mal é tão grande que se parecem a doentes que, acostumando-se à sua doença não pensam mais em se curar.

Mas nós católicos, não somos como eles nisso?

Não, ao contrário, devemos compreender, meditar e por em prática a palavra de nosso divino Mestre que nos diz: “É preciso rezar sempre, sem nunca descansar (Luc.XVIII,1.).”

Se não somos como eles, o que devemos fazer?

Pedir humilde e instantemente a graça de rezar e para esse fim repetirmos a palavra dos Apóstolos a Nosso Senhor: “Senhor, ensinai-nos a rezar (Luc.XI,1)”

6. O que é a oração

Como definimos a oração?

A oração é uma elevação da alma para cumprirmos nosso dever para com Deus e lhe pedirmos suas graças.

Que deveres cumprimos para com Deus na oração?

Devemos adorá-lo como nosso Mestre soberano, e agradecer nossa criação e todos os inúmeros benefícios que recebemos.

E que devemos pedir a Deus?

A cura de nossos males e a participação em seus bens.

E de onde vem a oração?

De Deus pela graça e de nós pela boa vontade que ele nos inspira.

Qual é o centro nervoso da oração?

É o desejo. Santo Agostinho também define a oração: “Um desejo e um gemido do coração se dirigindo a Deus: Cordis desiderium et gemitus ad Deum directus.”

7. Oração mental e vocal

Como se chama a oração quando ela é apenas um desejo do coração?

Chama-se oração mental, porque então é só a alma (mens mentis, mentalis) que a produz, sem que apareça nada  exteriormente.

A oração pode então não ser somente mental?

Sim, sem dúvida, pois podemos exprimir por palavras o desejo interior da alma, e essas palavras fazem que a oração se chame vocal (vox vocis, vocalis).

O que se nota nisso?

Que se pode rezar sem as palavras da oração e também dizer as palavras da oração sem rezar.

E porque isso?

Porque a oração consistindo essencialmente em um desejo do coração, se a alma se eleva a Deus com esse desejo interior, ela reza. Se, ao contrário, ela pronuncia as palavras da oração sem que as anime o desejo interior, ela não reza, apenas fala.

8. Razões da oração vocal

Se a oração é apenas o desejo do coração, parece que basta que ela seja mental?

Se fossemos anjos seria assim; mas não somos anjos e as palavras nos são necessárias.

Porque?

Porque fixadas em nossa memória, ou ao menos presentes em nosso espírito, fazem-nos lembrar as coisas que temos para pedir a Deus, e nos excitam a lhe pedir.

Mas porque?

Porque o coração sente mais vivamente as coisas quando são, ao mesmo tempo, concebidas pelo espírito e exprimidas pela voz. As palavras nos ajudam a desejar mais e assim a rezar melhor.

É preciso, então dar muita importância à oração vocal?

Sem nenhuma dúvida, porque ela nos presta um grande socorro; é preciso nos aplicar em faze-la bem, conformando nossos desejos às palavras que pronunciamos.

Há outras razões por que devemos estimar a oração vocal?

Temos três que são consideráveis: primeiramente Nosso Senhor nos ensinou o Pai Nosso que é a mais admirável das orações vocais; segundo, o Espírito Santo inspirou os Salmos que formam a oração da Igreja há três mil anos; terceiro, enfim, a Igreja compôs uma quantidade de orações que são de grande beleza e de um valor inestimável para nossas almas.

9. A oração pública e particular

A oração é um desejo do coração, no entanto há a oração de toda a Igreja?

A oração pode ser privada ou pública; privada, quando é feita só por uma alma; pública quando é feita em uma reunião de fiéis que se dirigem a Deus, todos juntos numa mesma oração.

O que há de comum na oração pública e na oração privada?

Uma e outra devem ter como ponto de partida um desejo do coração, sem o qual não haverá oração.

O que há de particular a cada uma dessas duas espécies de orações?

A oração privada pode ser, à vontade, mental ou vocal, enquanto que a oração pública é sempre uma oração vocal.

Podemos nos contentar só com a oração privada?

Se estivéssemos sozinhos na terra, estaríamos reduzidos à oração privada; mas vivemos em sociedade, e a sociedade deve, como o indivíduo, prestar seus deveres a Deus e lhe pedir suas graças.

Temos que estimar tanto a oração privada como a oração pública?

É preciso estimar a ambas, porque todas duas são necessárias, e uma auxilia a outra; mas apesar de iguais, a oração pública é mais valiosa aos olhos de Deus.

10. Razões da oração pública

Então temos grandes motivos para amarmos a oração pública?

Temos vários e poderosíssimos motivos.

Diga-nos quais são?

Nosso Senhor disse: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, estarei no meio deles (Mat.XVIII,20).” E mais: “Se dois de vós na terra se unirem entre si, seja qual for a coisa que eles pedirem, meu Pai que está no céu, lhes dará (Mat.XVIII,19).”

O que se nota nessas palavras de Nosso Senhor?

Nota-se que nosso divino Salvador, de alguma maneira está mais atento à oração coletiva do que a uma oração privada; e que concede mais facilmente ao pedido de muitos o que talvez não concedesse ao pedido de um só.

Haverá outras vantagens na oração pública?

Há, e muito grandes. Todos os fiéis se unindo na oração, animam-se, encorajam-se e se edificam uns aos outros; os fortes sustentam os fracos, os fracos se esforçam para seguir os fortes e a oração se torna mais poderosa diante de Deus. “Nós nos unimos na oração, diz Tertuliano, e fazemos a Deus uma violência que lhe é agradável. Haec vis Deo grata est.

11. Os graus da oração

O que se chama os graus da oração?

Chamamos assim os diferentes estados daqueles que rezam; pois essa diferença de estado produz orações mais ou menos perfeitas, daí os diversos graus de oração.

Quais são os diversos estados daqueles que rezam?

Como a oração consiste no desejo que o coração manifesta a Deus, compreende-se que o desejo sendo maior ou menor e a manifestação do desejo mais ou menos ardente deve haver inumeráveis graus de oração.

De onde vem a diversidade de desejo nas almas?

Do grau de conhecimento: pois ninguém deseja o que não conhece; mas quando o bem é conhecido, ele é tão mais desejado quanto mais é conhecido.

E de onde vem o maior ou menor ardor na manifestação do desejo?

No grau do amor: porque quanto mais se ama o bem,  mais somos atraídos por ele. Quem não ama, não deseja: porém quem ama muito deseja muito.

Como se chama o conhecimento que faz amar?

É a Fé.

E como se chama os desejos que nascem desse conhecimento?

São a Esperança e a Caridade, segundo essa bela palavra de Santo Agostinho: Fides credit, Spes et Caritas Orant - a Fé crê, a Esperança e a Caridade oram.

12. A oração dos pequeninos

Os pequeninos são capazes de rezar?

A rigor, é preciso dizer que não, porque não sabem; porém como dizia uma criança: Eu amo melhor, sim!

E porque?

Porque a criança, pronunciando as palavras da oração, exprime diante de Deus que sabe bem, o que lhe foi posto no coração pela graça de seu batismo.

Explique melhor?

A criança batizada, rica em inocência e graça santificante tem no coração a fé habitual, como também a esperança e a caridade, e quando ela diz a Deus: Meu Deus! Eu vos amo de todo coração! exprime - sem saber - uma linda verdade bem conhecida de Deus, e diante da qual ele não é insensível.

O que pensa concluir daí?

Que as orações desses anjos da terra é agradável a Deus, e que os pais e mães devem achar um verdadeiro encanto em fazer seus filhinhos rezarem, e animar seus próprios desejos de rezar.

É essa oração útil à própria criança?

Certamente, pois essa oração a forma na oração; essa oração faz a criança fazer atos que já saberá fazer quando, chegando a idade da razão, será obrigada a faze-los.

13. A oração das crianças na idade da razão

O que acontece na alma da criança que reza quando já tem o uso da razão?

A criança começa a ficar atenta ao ato que faz, e desde então começa a rezar realmente.

Qual é o gênero de atenção da criança?

Basta para a criança que tenha o pensamento em Deus que a vê, que a escuta, e tenha o desejo de fazer alguma coisa que  seja agradável a Deus, assim, ela faz sua oração.

Porque diz que isso basta  para a criança?

Porque ela não é capaz de fazer mais, não tendo suficiente conhecimento para penetrar no sentido das palavras que pronuncia na oração.

Como a criança se elevará numa oração mais perfeita?

Adquirindo a inteligência dos mistérios do Símbolo dos Apóstolos, e os repassando em seu espírito dizendo o Credo; adquirindo o sentido dos pedidos do Pater (Pai Nosso), à medida que os dirige a Deus; e crescendo tanto em conhecimento quanto em desejo, crescerá na oração.

14. A oração dos verdadeiros fiéis

O que deve ser a oração dos verdadeiros fiéis?

Um exercício das três virtudes: a Fé, a Esperança e a Caridade.

Como essas virtudes formam nossa oração?

A fé nos esclarece sobre o passado, o presente e o futuro. A Fé nos ensina nossa criação, a queda original, a redenção por Nosso Senhor; nos mostra a vida eterna e o caminho que a ela conduz, nos mantêm na espera dos julgamentos de Deus. Quem não vê que todas essas grandes e divinas luzes nos dispõem de um modo feliz para rezar?

Como a Esperança e a Caridade formam a oração?

Fazendo nascer em nós os santos desejos do perdão dos pecados, da graça necessária para a observação dos mandamentos, de nossa felicidade eterna, de agradar a Deus, de amá-lo e de vê-lo eternamente.

Qual é o cristão que reza bem?

Aquele que tem sempre no coração o santo desejo e que o exprime muitas vezes para Deus.

Qual é o que reza muito bem?

Aquele que consegue obedecer à palavra de Nosso Senhor: É preciso rezar sempre (Luc.XVIII,1).

15. A oração dos perfeitos

Quais são os perfeitos na Igreja?

Aqueles que tiveram a felicidade de vencer o pecado, que vivem numa fé luminosa, numa esperança inabalável, numa caridade ardente.

Qual é a oração desses perfeitos servidores de Deus?

Ela é o fruto de um conhecimento muito elevado, de um desejo fervoroso, e desde então ela se eleva a Deus como um perfume puríssimo, como um incenso de agradável odor.

O que pedem os perfeitos e suas orações?

Aqueles que rezam pedem a Deus que nos livre do mal e a possessão de seu bem; apenas eles pedem essas graças numa luz mais abundante, com uma humildade mais profunda, com desejos mais ardentes, e é isso que faz a perfeição da oração.

Os perfeitos têm ainda necessidade de palavras para  rezar?

Algumas vezes eles rezam sem palavras, algumas vezes com palavras; mas, mais são perfeitos, mais têm estima pelas orações da Igreja, sobretudo pelos Salmos, o Pai Nosso, etc.

Qual é então o segredo da perfeição de suas orações?

O segredo está em querer o bom Deus de todo seu coração e de toda sua alma.

 

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