Que fim perseguem eles?

Dom Lourenço Fleichman OSB

«E toda a terra, cheia de admiração, seguia a bêsta». (Apoc.13, 3)

Cada vez mais vou tendo a impressão de que os homens estão mergulhados numa profunda perplexidade. Eles olham para o mundo que os cerca, entram dentro dele, querendo fazer como todo mundo, são membros de uma tal tribo global, mas de vez em quando, um deles exagera no uso das "liberdades", e então causa um certo susto nos demais.

Os assassinatos cometidos por adolescentes, nos Estados Unidos, são um exemplo. Outro, é o enfermeiro compatriota nosso, que resolveu juntar a compaixão pelos doentes que sofrem, com certas vantagens para seu bolso. Já passou o tempo em que o sinal da modernidade era os filhos enfrentarem os pais. Agora eles metralham.

Tenho ouvido falar de reuniões em escolas, onde os diretores estão suplicando aos pais que voltem a educar seus filhos, sabendo dizer não, sabendo estabelecer limites para os filhos. Vai ver até que algum mais afoito diz, sem querer, que é preciso dar umas palmadas...

Alguns diretores chegam a citar os anos 60 como sendo o início de tudo...(vocês talvez já tenham esquecido, que o mundo enlouqueceu na década de 60, realizando uma destruição das últimas barreiras contra a barbárie: é o advento dos hippies, do sexo livre, dos filhos xingando seus pais, das drogas, etc.)

Isso me deixa com certa nostalgia na alma. Verdadeiramente eles estão desnorteados. Assustados com o que lêem nos jornais, com o que vêm em casa; procuram explicações, mas não as encontram. Por que?

A resposta é simples: perderam o rumo, perderam o norte, não têm mais um critério de vida civilizacional.

Mas são eles mesmos os próprios culpados. Por terem achado tudo muito lindo, ao jogar fora dois mil anos de civilização católica. Finalmente, livres de todos os tabus, saíram pelo mundo, alegres e felizes, respirando um ar puro, cada vez mais puro pela preservação do planeta, e cada vez mais fétido, pela decomposição das almas.

Qual o critério que eles perderam? A razão e a Fé. A casa e a Igreja. Essa é a luz que lhes falta.

Já que escrevo para católicos, vamos supor que todos vocês saibam ou acreditam, que o homem é composto de corpo e alma. Que essa alma foi criada por Deus no momento da concepção, exclusivamente para aquele corpo. Temos então uma sementinha já toda ela programada no código genético par ser o Paulo ou a Ana, daqui a nove meses. Deus cria uma alma espiritual, capaz de conhecê-Lo e amá-Lo, e sopra este espírito naquela sementinha corporal. Não é difícil entender que é a alma que vai dar vida ao corpo. No caso do homem, a vida será espiritual, pois a alma é capaz de conhecimento e de amor. Já o animal terá uma vida apenas capaz de movimento de sensibilidade, mas não de inteligência. A planta terá ainda menos capacidades, insensível que ela é. O que diferencia o homem dos demais seres vivos é seu espírito inteligente.

E é evidente que essa alma imortal tem uma finalidade, a qual só pode ser adequada à sua natureza, ou seja, só pode ser espiritual. Essa finalidade é a de usar essa capacidade intelectual e a capacidade de amar no máximo de sua realização, que é conhecer e amar seu próprio Criador, Deus Nosso Senhor.

Todas as instituições humanas procuram dar ao homem alguma ajuda, alguma facilidade para sua vida natural. O Estado protege o cidadão (pelo menos deveria proteger e não assaltar), a Escola ensina uma profissão (deveria ser o complemento da educação familiar), o emprego traz o sustento, etc.

Mas era preciso uma instituição que se ocupasse da alma, que lhe ajudasse na sua finalidade última, e que, ao mesmo tempo, tivesse autoridade para isso. Foi por isso que Nosso Senhor Jesus Cristo fundou a Igreja, deixando-a na terra com sua autoridade divina para ajudar os homens a alcançar seu fim último, que é a vida eterna. E os meios para alcançar este fim são de obrigação para os homens. Deus nos fez capazes de conhece-Lo e de amá-Lo, mas não admite que nós desprezemos essa capacidade. Sua Lei Santa, revelada através dos profetas e, sobretudo, por seu Filho Encarnado, é a luz de sua Vida íntima lançada sobre a vida dos homens.

Houve quase dois mil anos para os homens viverem assim. Foi a civilização cristã, que sobreviveu a tantas dificuldades, a guerras, às faltas dos seus filhos gananciosos. Mas essa civilização acabou. Não somente pela quantidade de homens que desprezam a Igreja, hoje, mas também por causa do golpe de misericórdia que lhe foi aplicado, pelas mais altas autoridades dessa mesma Igreja, reunidas em Concílio, sob a presidência de dois Papas. O Concílio Vaticano II estabeleceu definitivamente a morte de uma civilização construída sobre o Evangelho (apesar dos pecados dos seus filhos).

Nos últimos séculos, já as nações rechaçavam a autoridade da Igreja, num mundo cada vez mais louco. Ela porém, guardava sua dignidade de voz suprema dos desígnios dos homens, devido à seu fim sobrenatural, de salvar os homens pelo Sangue Preciosíssimo de Nosso Senhor. Com Vaticano II, as autoridades da Igreja renunciam a este papel. E isso duplamente: primeiro aceitando a idéia corrente de que ela não seria a detentora da verdade, a única fundada por Cristo; em seguida, perdendo a visão sobrenatural de sua missão, mergulhando em preocupações sociais e políticas, voltadas para a vida natural dos homens.

Está derrubada a última barreira que ainda segurava os homens. Maravilhados com tanta liberdade, sairão por aí inventando mil novidades, oficializando mil pecados, divertindo-se à valer. Não querem saber de proibições, de castigos, de repressões, como dizem. Tudo pode, tudo é permitido. Chega a ser difícil lembrar todos os aspectos de tamanha catástrofe para a humanidade. Mas a técnica vai muito bem, obrigada. E em nome dos satélites, todos os males e pecados são perdoados.

Enquanto esse mundo vai ganhando espaço, vai se difundindo, o tempo vai passando. Mais de uma geração já passou. A memória de uma vida sob a luz divina da Igreja já é coisa de museu. Os homens de hoje não têm mais noção do que seja isso. Os dogmas religiosos foram substituídos pelas ideologias dominantes; os dias santos de guarda substituídos por feriados pagãos, a moral católica, retrato da vida divina, foi ridicularizada ao extremo, dando lugar ao moralismo ferrenho dos jornalistas e das CPIs do Congresso.

Acima eu falei sobre a tendência atual de educadores alertarem os pais de alunos sobre os riscos de não impor limites aos filhos, de nunca dizer não. Só neste mês de junho, três publicações me chegaram às mãos falando sobre o tema: a revista Veja, a revista Educação nº 34, de fevereiro de 1999, e um artigo do Jornal O Globo, de um domingo recente. É curioso que, de repente, todos comecem a se preocupar com isso. Aparentemente é uma boa tendência, mas quando analisada mais de perto, percebemos que ela esconde uma fraude: o que está em jogo é o prejuízo psicológico das crianças, mergulhadas precocemente num ambiente sensual e sexual, num excesso de liberdades que as levam a distúrbios psíquicos e sociais. Eles descobriram, um pouco tarde, que o sexo precoce faz mal à saúde e que liberdades em excesso geram injustiças. E é só!

Vejam bem, para um casal católico, esta preocupação está aquém da realidade. Não é essa nossa principal preocupação. Antes de tudo, acima de tudo, com todas as forças de nossa alma, devemos educar nossos filhos para agradar a Deus! E isso significa agir sempre, em tudo, segundo os dez mandamentos: honrar pai e mãe, que nos ensina a respeitar o princípio de autoridade; não pecar contra a castidade, que nos ensina que o sexo só pode ser realizado dentro das finalidades santas do casamento católico! E os demais...

Mas isso, nem a revista Veja, muito menos O Globo, têm em vista quando alertam os pais para limitarem seus filhos.

Ou seja, voltamos ao que dizíamos: os homens abandonaram a submissão à autoridade divina da Igreja, e com isso perderam o rumo da vida. Perdendo o rumo, estão dando voltas como baratas tontas. Cansados, tontos, abandonados às paixões que são fonte de gozo mas também de dor, ficam mergulhados nesta perplexidade burra e medíocre. Não querem ler nada que lhes exija raciocínio e oração: recusam a luz dos santos doutores e a fé que liberta a inteligência.

E eu pergunto: esses alertas equivocados surtirão algum efeito? Minha convicção é que nada mudará. Porque a liberdade desenfreada dos jovens de hoje envolve muito, mas muito dinheiro: da Xuxa, com suas roupas e bibelôs, passando pelo Cartoon, canal de TV à cabo, que metralha na consciência das crianças "desenhos, e mais desenhos, e ainda desenhos", cada um mais estúpido que o outro, chegando aos "games" burrificadores, quando não incentivadores de crueldades, as discotecas e bailes onde tudo acontece.

Quando Deus não é mais a regra, o parâmetro, a medida do reto agir, o homem passa a ser seu próprio Deus. É assim que querem nos sujeitar a esses moralistas do mundo moderno, os jornais e as CPIs dos nossos políticos. Eles ditam as regras que nós devemos cumprir, enquanto enchem seus bolsos de dinheiro, mais dinheiro, e ainda dinheiro.

Qual é, então, o nosso combate?

Silenciar, no fundo do nosso coração, os ruídos estranhos dessa guerra louca, fugir dos desejos que nos impelem a querer ser como eles: ricos, livres, poderosos, gozadores da vida.

Praticar as virtudes cristãs, amar a pobreza, usar dos bens que Deus nos permite ter com generosidade e desprendimento. Amar a castidade, ensinar nossos filhos a resistir e a lutar contra tendências do corpo que são, exatamente, tentações do diabo, mesmo se correspondem à fisiologia da idade. Ler para alimentar a razão, rezar para alimentar a fé. Descobrir no Santo Sacrifício do Altar o refúgio necessário onde, domingo, vamos ganhar forças para lutar todos os dias.

Acordem!

É preciso sacudir o peso que lhes foi colocado sobre a alma, a vergonha de se achar diferente porque os outros não vão à missa no domingo, andam nus pelas ruas ou traem sem escrúpulos as promessas feitas diante do altar.

Experimentem a grande liberdade de não serem iguais a eles, de não serem escravos da moda, ou dos pecados do mundo. O que se resume nisso: tenham personalidade, sejam o que de fato são : homens, inteligentes e capazes de amar o Bem último de suas almas, o Único necessário, Aquele que, só Ele, pode trazer repouso para suas almas cansadas. Católicos, cumpridores das promessas do vosso batismo, e que, mais do que tudo, só querem amar ao Senhor Nosso Deus, Três vezes santo, que derramou seu próprio Sangue para nos conquistar um lugar no Céu.

E enquanto eles continuam a sorrir, perplexos e fracos, diante das loucuras que vêem todos os dias na televisão, tenhamos plena consciência de que os tempos são maus, e que é preciso estar vigiando, para que não suceda que, vindo o Senhor no meio da noite, nos encontre sonolentos e adormecidos.

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